domingo, 12 de janeiro de 2014

brigar com eles amá-los

eu queria mesmo que essa dissertação fosse um ajuntamento de signos. um ajuntamento de poemas, de referências, de ideias, de conceitos e de refrões. ajuntamento de paisagens, de redes, de pontos e vírgulas. ajuntamento de esperança e desespero. no final das contas do rosário, é assim mesmo que a gente vive: ajuntando signo, dando sentido a nossa vida por meio desses signos. cair no esquecimento é não ser mais signo dentro de uma rede de signos. signos que não precisam necessariamente de significantes - esses estão dispersos, sãos os mais diversos e inevitáveis possíveis - mas cuja ação efetua uma força

quero inventar mesmo uma nova forma: de escrever. um novo estilo? não sei. mas se não for aqui, não sei onde mais escrever desse jeito. não sei mais como ser ou não ser lido. (é) preciso ser lido. é narcísico, mas também é comunicação. comunicação de forças, diria Derrida, mais que o transporte de um sentido cujo conteúdo não muda de acordo com o meio (escrita, fala, algoritmos). sim, muda sim. muda na fala, muda na escrita. mudam a todo instante. os signos estão em movimento, é preciso destreza para capturá-los: para que logo fujam. é preciso força e violência para os capturar. é dessa violência que não quero lançar mão.

uma escrita que seja menos dissertação e mais poesia. porque, da poesia, tiro essa leveza; das palavras que deixam de ser e significar ou que significam doutras coisas na mesma frase, ou dois segundos depois de escritas: inscritas, cravadas. minha vertigem é escrever. aqui aciono os riscos, e toda a náusea desse gesto me toma. como, escrevo, ou vomito. nem quero mais comer de tanto escrever. sequer vomito. por que eu estaria aqui se não fosse para escrever?

quero menos uma linearidade cadente, por meio da qual os signos se acumulam, e cuja última palavra dá o tom de todo o escrito. não, isso não me satisfaz. é preciso que os signos se percam, se contradigam, ou nem se falem entre si. é preciso uma bagunça, uma confusão, o caos do/de signo. porque assim eles podem participar das diversas redes de signos, podem significar para fora desse texto: podem se citar, vinculam-se a outros significantes, geram forças outras. quero abrir, mais que fechar. quase que essa dissertação não sai. pois quis que ela saísse voando.

é como se, criado em meio e ao intermédio de tantas imagens, de tantas lembranças e ansiedades, de tantos corpos que acessei na internet e por meio da pele e do sêmen; por entre as palavras que são escritas, as poucas que são lidas, por entre os diversos livros, e obras e poemas lidos e escritos e revistos, eu preferisse o caos da desordem dessas coisas. por que? porque prefiro o caos para a potência de escolher os signos que me seguem e que eu sigo, e compor deles e com eles os caminhos, as escolhas, os desejos. esse trabalho microfísico, dessa materialidade do íntimo, do anseio das mãos que pescam e pesquisam por amigos e informações por meio da rede mundial de computadores.

já não tenho mais tempo, e o que me sobra são as minhas palavras. se falo de força, é pela força que implicam em mim que foucault, derrida e butler, dentre outros, constam aqui. mas constam mais como uma necessidade formal de citação, pois essa escrita, ainda, infelizmente, parece não saber lidar com essa força. queria que eles fossem personagens dentro de um romance, de uma estória sem fim. butler uma irmã sapatão e machuda, foucault um tio que morreu nos anos 1980 com AIDS, um ídolo, e derrida um senhor louco com quem tomo café na sua pequena e humilde casa, nos arredores da igreja onde fui coroinha. e assim eles falariam comigo, me diriam mais da vida do que da academia, queria um café com eles, mas sem o alerta acadêmico de gravar-lhes os ditos, de configurar suas falas, de trazê-los citados ao texto. não: queria um café comum, com ideias loucas vindas ao sabor do gole. pelos não-ditos; brigar com eles, amá-los.


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